segunda-feira, 26 de maio de 2014

Histórico do Grupo

"O próprio nome escolhido pelo o grupo "Apoena", significa enxergar longe, enxergar além, é enxergar a marca daqueles que permaneceram, daqueles que foram, é enxergar os pequenos meninos que se transformaram em grandes jovens, é enxergar um projeto que nunca esteve ausente, e sim sempre acreditou no nosso trabalho."
 
O coletivo se formou em 2011, com um grupo de jovens numa oficina de teatro, no mesmo ano foi comtemplado para participar do Projeto Conexões Teatro Jovem 2011 e 2012 - primeiro com a peça "Teseu" de Cássio Pires, foi um presente o texto falava de formação de grupo, suas tramas, amor, discussões, encontros, desencontros e amizades. No ano seguinte, em 2012, com o texto "Flor da Pele" de Mariana Marteleto, a autora relata uma história poética, que trás a transformação de menina-mulher, seus questionamentos, seu corpo, seus pensamentos e dúvidas.
 
"Teseu" nos rendeu prêmios no Festival da Fundação das Artes Estudantil em São Caetano,em 2012. E com a peça "Flor da Pele", participamos de dois festivais onde em ambos fomos premiados, em 2013, no Festival Estudantil do Sesi de Sorocaba e Festival Fundação das Artes Estudantil em São Caetano.
 
Após abordar as histórias dos três anos de existência do Coletivo, os nossos saberes está ligado ao Projeto Conexões. Em 2014, esperamos retribuir o convite que foi muito aguardado. Ao rever a breve trajetória do Coletivo, talvez possamos a justificar o nome Apoena. Aquele que vê mais longe.

Workshop de Imersão - Informações

Dia 31 de maio, sábado - das 9h às 17h15, no Colégio São Luís (Rua Haddock Lobo, 400)
Participam os grupos que irão montar Mentiroso e A Voz do Silêncio
das 9h às 10h - aquecimento com todos os grupos
das 10h às 12h30 - grupos se dividem para conversa com o autor do texto que irão montar
das 12h30 às 14h - intervalo para almoço (o Conexões oferecerá almoço gratuitamente para todos os grupos)
das 14h às 17h - segunda parte do workshop: atividades práticas/jogos teatrais
das 17h às 17h15 - encerramento

Dia 1º de junho, domingo - das 9h às 17h15, no Colégio São Luís (Rua Haddock Lobo, 400)
Participam os grupos que irão montar Anoesis Cimbelino XXI: um ensaio
das 9h às 10h - aquecimento com todos os grupos
das 10h às 12h30 - grupos se dividem para conversa com o autor do texto que irão montar
das 12h30 às 14h - intervalo para almoço (o Conexões oferecerá almoço gratuitamente para todos os grupos)
das 14h às 17h - segunda parte do workshop: atividades práticas/jogos teatrais
das 17h às 17h15 - encerramento

Estamos resolvendo uma questão de agenda para definir se o workshop do texto "Cérebro à Vinagrete" será mantido no sábado ou se acontecerá no domingo.

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Um Convite Inesperado - Apoena no Projeto Conexões 2014

​Querido Cacá,

Tudo bem? Hoje realizamos o sorteio das cotas de participação do Conexões e o Apoena infelizmente não foi sorteado. Mas, a equipe do projeto decidiu convidá-los para participar do projeto como "grupo convidado" porque acreditamos que o Apoena fez história dentro do Conexões e o grupo se tornou um grande embaixador do projeto por onde passa, ou seja, nossa parceria precisa e merece continuar! Vocês topam?

Estamos com um orçamento menor este ano e infelizmente não conseguiremos cobrir o transporte dos grupos (de nenhum grupo, mesmo os contemplados pelo sorteio e os residentes) para as atividades do projeto. Então, se vocês aceitarem participar, teriam que cobrir os custos de deslocamento para o workshop, ensaio geral e apresentação por conta própria. Existe essa possibilidade?

Continuamos tentando reverter essa situação procurando patrocínio (estamos aprovados na Rouanet e no PROAC ICMS - buscando captação de recursos) e apoios diversos, mas por enquanto essa é de fato a nossa realidade.

Esperamos contar com a participação de vocês!

Aguardamos seu retorno, já na torcida para que dê certo!

Um forte abraço,
Carol

Carolina Faria
Produção Conexões - Projeto Teatro Jovem




Olá Carol.
 CLARO QUE TOPAMOS!!!
É uma honra voltar para o projeto e como grupo convidado que responsa. 

O Coletivo Apoena quer estar sempre ao lado de pessoas que apoiam a arte.

E todas as nossas histórias (pequenas) valeram a pena. 
Agradecemos a confiança.
Namastê

Bjs.
Cacá Rodriguez

quarta-feira, 12 de março de 2014

Buscando nossa própria identidade

PARA LEITURA DO GRUPO DA TERÇA-FEIRA.
BERTOLT BRECHT - HISTÓRIAS DO SR. KEUNER
Organização
O sr. K. disse uma vez: "Aquele que pensa não usa nenhuma luz a mais, nenhum pedaço de pão a mais, nenhum pensamento a mais".
Dos detentores do saber
"Quem detém o saber não pode lutar; nem dizer a verdade; nem prestar um serviço; nem deixar de comer; nem recusar honrarias; nem dar na vista. Quem detém o saber possui, de todas as virtudes, apenas uma: ele detém o saber", disse o sr Keuner.
O esforço dos melhores
"Em que está trabalhando?", perguntaram ao sr. K. Ele respondeu: "Tenho muito o que fazer, preparo meu próximo erro".
A questão de existir um Deus
Alguém perguntou ao sr. K. se existe um Deus. O sr. K. respondeu: "Aconselho refletir se o seu comportamento mudaria conforme a resposta a essa pergunta. Se não mudaria, podemos deixar a pergunta de lado. Se mudaria, posso lhe ser útil a ponto de dizer que você já decidiu: você precisa de um Deus".
Questões convincentes
"Já percebi", disse o sr K., "que afastamos muitas pessoas dos nossos ensinamentos, por termos uma resposta para tudo. Não poderíamos, no interesse da propaganda, fazer uma lista das questões que nos parecem totalmente irresolvidas?"
O reencontro
Um homem que sr. K. não via há muito o saudou com as palavras: "O senhor não mudou nada". "Oh!", fez o sr. K., empalidecendo.
Conversas
"Não podemos mais conversar um com o outro", disse o sr. K a um homem. "Por que?", perguntou ele assombrado. "Em sua presença não me ocorre nada sensato", queixou-se o sr. K. "mas isso não me incomoda", disse o homem para consolá-lo. "Acredito", disse o sr. K. irritado, "mas a mim incomoda."
Quando o sr. K. ama uma pessoa
"O que faz você", perguntaram ao sr. K., "quando ama uma pessoa?" "Eu faço um esboço dela", disse o sr. K., "e cuido para que seja semelhante." "O quê? O esboço?" "Não", disse o sr. K., "a pessoa."
Sucesso
O sr. K. viu passar uma atriz e disse: "Ela é bonita". Seu acompanhante disse: "Ela teve sucesso recentemente porque é bonita". O sr. K. se aborreceu e disse: "Ela é bonita porque que teve sucesso".
O elogio
Ao saber que tinha sido elogiado por ex-alunos seus, disse o sr. K.: "Depois que os alunos se esqueceram há muito dos do mestre, ele ainda se lembra muito bem deles".
Espera
O sr. K. esperou algo por um dia, depois por uma semana, e depois ainda por um mês. Por fim ele disse: "Um mês eu poderia muito bem esperara, mas não este dia e esta semana".
Irritação e ensinamento
"É difícil ensinar aqueles com quem estamos irritados", disse o sr. Keuner. "Mas é muito necessário, pois são os que mais necessitam."
["Quando estou em harmonia com as coisas..."]
"Quando estou em harmonia com as coisas", disse o sr. Keuner, "eu não compreendo as coisas, elas me compreendem."
Boa leitura! Bom trabalho!

Referências para o novo processo








Novo Projeto - Blecaute

BLECAUTE - Davey Anderson/2009

(tradução Marco Aurélio Nunes)
"Tudo que eu me lembro é: Eu ouvia gritos. Era como estar num sonho, mas acordado ao mesmo tempo. E tudo que eu escuto é: Por favor, não! Pare! E aí... Eu sei lá. Na manhã seguinte, eu estava numa cela de cadeia. Eu não sabia como tinha ido parar lá. E eu pensei assim: Ah, não... O que foi que eu fiz?"
Uma peça curta sobre ser vítima de bullying, revidar, tentar conquistar um espaço para si mesmo, se tornar feroz, fazer uma coisa idiota, perder tudo e depois encontrar o caminho de novo.

Texto Completo



Blecaute
Inspirada nas histórias de um jovem delinquente de Glasgow
de Davey Anderson
Tradução
Marco Aurélio Nunes








 Uma nota sobre o texto
Esta peça não vem com manual, nem com uma série de instruções para sua encenação. Como irão ver, não existem marcações de palco definidas e nenhuma indicação na margem do texto de quem fala o quê. Também não apresenta uma transcrição literal das minhas entrevistas com o jovem cuja história é contada, embora a maioria das palavras seja dele e não minha. O texto impresso aqui tem o propósito principal de ser uma obra de transmissão verbal de uma história, deixada em aberto para acolher diferentes interpretações visuais e teatrais. As palavras podem ser ditas por qualquer número de atores, de um a cem. As falas podem ser alteradas, quando apropriado, para se adequarem aos dialetos dos atores. E a direção pode ser tão simples ou elaborada quando vocês quiserem. Meu único pedido é que algumas coisas sejam deixadas para a imaginação da platéia.

                                                                                                                                                                    
1
Imagina
Você acorda
Abre os olhos
E fica tipo assim
Onde é que eu to?
Uma sala pequena
Luzes fortes
Paredes brancas
Uma porta de metal
Caramba!
Imagina que você acorda e está numa cela de prisão.
Você vai até a porta.
Você esmurra ela.
Gritando
Berrando
O que é que eu to fazendo aqui?
Tum Tum Tum
E imagina que o gambé vem até a porta.
E ele vem com essa
Fala baixo aí.
E você diz
Que foi que eu fiz?
Ah, CE não ta sabendo?
Você balança a cabeça.
Qual é?
E o gambé fica só olhando pra sua cara que nem CE fosse mó marginal, ta ligado?
Imagina que ele fica só olhando pra sua cara e manda essa
Cê  tá sendo acusado de tentativa de homicídio, pentelhinho.
E você ia ficar tipo assim
Fala sério
Que foi que eu fiz?
E você ia começar a lembrar
De tudo
Desde o comecinho
E ia tentar lembrar
Como é que eu vim parar aqui?

2
Então, você ia começar a lembrar do seu pai.
Ele batia em mulher.
Ele batia na sua mãe todo o dia
Do dia que eles se casaram até o dia que eles se divorciaram.
Ele sentava feio a mão nela.
Então ela parou de trabalhar.
Ela não saía mais de casa.
Porque ela tinha vergonha.
Ela não tava mais a fim de ficar andando na rua com a cara toda roxa.
E você ia lembrar que sua mãe não queria que você crescesse e ficasse que nem ele.
Ela queria que você fosse um advogado famoso
Ou um médico famoso
Um famoso qualquer coisa.
E você ia lembrar que vocês eram pobres.
Mas não eram miseráveis.
Porque sua mãe ainda dava um jeito de botar a janta na mesa toda noite.
Ela dava até o último centavo pra você.
Ela não ligava muito pra ela mesma.
Mas você ia lembrar que nunca falava direito com ela.
Porque você chegava da escola e subia as escadas direto.
Tiago?
Hein.
Seu jantar ta na mesa.
Você descia. Pegava o prato.
Obrigado, mãe.
Subia de novo as escadas.
Então você nunca falava direito com ela.

3
Mas você ia lembrar do seu avô.
Ele era a coisa mais parecida com um pai de verdade que você tinha.
Ele tomava conta de você.
Ele fazia tudo que um pai faria.
Ele segurava na sua mão
Ele levava você pra fazer compras
Ele jogava joguinho idiotas com você
Mas o melhor de tudo, ele levava você no jogo do Corinthians todo sábado.
Ele levava você pra ver as passeatas políticas.
Você ia lembrar de como ele te ensinou a tocar flauta.
Mas você não tocava Caminhando e cantando
Nem pendurava a bandeira do “Partidão”
Ele te ensinava a guardar essas coisas pra você mesmo.
Mas aí, ele teve câncer
Você ia se lembrar disso.
Então toda noite você ia ficar junto dele.
Jogar um carteado
Ajudar ele a montar um quebra-cabeça
Tomar um café e ficar olhando pela janela de trás.
Você ia lembrar de que era lá que os moleques da sua turma costumavam brigar com os moleques da turma da rua de baixo.
Eles partiam pra cima uns dos outros com garrafas e tijolos.
Depois com porretes e tacos de beisebol.
Depois com facas.
Você ia olhar pela janela pensando tipo assim
Aquele pirralho ta com uma espada?
Eu tô vendo isso mesmo?
E você e o seu avô
Vocês ficavam lá sentados e diziam
Por que é que eles estão brigando?
Porque o vô nunca se metia a sair batendo nas pessoas.
Ele mandava o recado dele com aboca, não com as mãos.
Ele só precisava falar, que todo mundo prestava atenção.
E você ia se lembrar de que sempre quis ser igual a ele quando crescesse.

4
Mas quando você tava crescendo, você não tinha muitos amigos.
Porque você era quieto demais.
Você era tímido.
Você era o garoto baixinho, tímido e cdf.
Você não se entrosava com ninguém.
E os amigos que você tinha, eles te usavam, ta ligado?
Porque era batata, se tivesse fazendo um puta dia de sol, todos eles se mandavam e deixavam você em casa.
Mas saca só, se tava chovendo lá fora, eles chegavam no seu cafofo e diziam
Oi, Tiago
Faz uma cara que eu não te vejo.
Como é que cê ta?
A gente pode dar um tempo aqui?
Eles não tavam nem aí com você
Eles só queriam um lugar pra dar um tempo.

5
E era assim na escola
Você levava porrada porque era gótico
Só porque você tinha cabelo comprido e usava coturno preto.
Eles chamavam você assim
Ô, urubu.
Ô, olha só pra ele
Ô, urubu!
Seu gótico nojento!
Você trepa com gente morta?
Como é que é?
Você vai pros cemitérios e fica zanzando pó lá, né?
Não.
Fica sim. Eu já te vi.
Desenterra os caixões na moral e estupra os cadáveres.
Seu animal nojento!
E você ia se lembrar das surras.
Um dos sacanas tirava o cinto
Ele enrolava o cinto na mão
E te dava porrada com aquilo.
Ah!!!
Depois, eles te jogavam escada abaixo
Não!
Chutavam as suas costelas
Para!
Mata esse urubu!!
E eles se mandavam na moral
E deixavam você lá, caído no chão
Enrolado feito uma bolinha.
Você ia lembrar de cada soco.

6
E você ia lembrar que não podia contar com ninguém.
Porque seu avô tava no hospital.
Então você só ficava sentado no seu quarto assistindo filme de terror
Noite após noite.
Ou lendo livros sobre serial killers.
Ou só olhando pra todas as figuras.
Aquilo te dava uma sede de sangue.
Aquilo te botava mó pilha
Ler sobre os assassinos.
Porque eles eram pessoas normais.
Mas eram misteriosos.
Qual é o barato deles?
O que faz eles pirarem de vez?
O que leva uma pessoa a fazer aquilo com outra?
Isso te fascinava.

7
Imagina
Você ta numa cela de cadeia
E começa a lembrar de tudo isso.
Mas não consegue lembrar de tudo isso.
Mas não consegue lembrar do que fez.
E então eles te levam pra uma unidade de segurança.
E eles levam embora o seu cinto
E eles levaram embora os cadarços do seu sapato
E eles levaram embora qualquer coisa que você possa usar para se matar.
Aí, um tal funcionário superior entra para falar com você.
E você pergunta pra ele
O que foi que eu fiz?
Filho, eu não posso te dizer.
Como assim, não pode me dizer?
Você precisa pedir uma ficha.
Então você pede a ficha.
E ele sai para buscar.
Imagina você esperando ele voltar.
Sua cabeça pirando.
Se lembrando...

8
Uma noite
Você apanhou só porque tinha cabelo comprido.
Aqueles caras te seguiram até em casa com facas de açougueiros e peixeiras.
Gritando
Mata o urubu!
Tentando te esquartejar
O caminho todo, até a porta da frente da sua casa.
Oi, Tiago.
Como foi a aula?
Você sobe as escadas direto.
Pra dentro do seu quarto
Bum!
Você olha no espelho.
Eu não sou urubu.
Você pega a tesoura.
Você corta seu cabelo mó curto.
Passa a gilete e raspa até a pele.
Tiago?
Aí, você olha pra você mesmo.
Seu jantar ta na mesa.
Já vai.
Vou mostrar pra eles que não é pra se meter comigo.
Você cata o prato.
Obrigado, mãe.
Péra um pouquinho.
Que foi?
O que aconteceu com o seu cabelo?
Você nem aí.
Eu me livrei dele.
Ela te dá uma olhada esquisita.
Você está parecendo um  skinhead.

9
Foi aí que você começou a assistir filmes tipo Skinheads – a força branca
E A outra história americana
 E você pensava lá dentro de você
É isso que eu vou fazer.
Aí, você começou a usar as botas grandes, do tipo militar.
A jaqueta de aviador
Os suspensórios
A coisa toda.

10
E aí você ia pra escola.
E fazia a saudação nazista nos corredores.
E as pessoas passavam batido por você.
E elas olhavam pra você tipo assim
Ufa
Ele é mó pirado.
Mas  a sensação era boa.
Porque você tava enchendo o saco deles.
E os professores falavam tipo assim
Para fora da classe.
Por que você está vestido desse jeito?
Porque eu gosto.
Vai pra casa colocar seu uniforme.
Você não vai poder voltar para escola se não mudar de roupa.
Aí você foi
Tá. A vida é minha. Eu visto o que eu quiser. Eu falo o que eu quiser. Eu faço o que eu quiser.
E você acendia um cigarrinho
E começava a andar pela escola
Fumando
Bancando o cara durão.
Ô, olha lá
Saca só o jeito dele.
E quando os sacanas viam você, em vez de sair correndo, você dizia
Beleza, quem vai ser o primeiro?
O que CE vai fazer, seu babaca?
Dois segundos.
Como é que é?
E você fazia assim
Tssssssss
E apagava o cigarro na sua própria pele.
Quem vai ser o primeiro então?
Cê ta legal?
Vamos nessa, quem vai me dar o primeiro soco?
Tiago...!!!
Vai. Eu vou colocar as minhas mãos pra trás.
Você precisa dar um jeito nessa sua cuca, cara. Cê não ta legal.
Aí, você pega uma cadeira
E joga em cima do filho da puta.
Aí ele começa a te socar
 O pau comendo
Todos eles começam a te espancar
Tiago!!
O que você está fazendo?
Não é do seu feitio.
Mas você fica lá
Com a cara ensangüentada.
Ô, a sensação é boa, mas sei lá.

11
E você ia lembrar que foi aí você começou a adorar a dor.
Os socos não machucavam mais.
Você se acostumou a ter aquela descarga de energia
A sensação do sangue pulsando nas suas veias.
E você ficava lá sentado no seu quarto
Com um monte de pôster nazista pendurado na parede
E você escutava música
Com aquela guitarra
E aquela  batida que te deixava no ponto
E você ficava imaginando como seria arrebentar o lábio de alguém
Ou abrir alguém com uma faca
Retalhar todo mundo
Só de pensar nisso já te fazia se sentir todo poderoso.

 12
E você ia lembrar da noite que finalmente aconteceu...
Tava chovendo.
Tiago?
É a sua mãe.
Gritando lá da escada.
Desliga essa música.
Vou dar um pulo no hospital pra ver o seu avô.
Você não responde.
Você quer vir comigo?
Hoje não, mãe.
Tem certeza?
Não, quero ficar em casa e assistir esse filme.
Bom, você quer ir até lá pra ver ele amanhã?
Tá bom, mãe. Tá.
Tudo bem.
Vou falar que você perguntou por ele.
Até mais tarde.
Ela sai naquela chuva.
Você coloca um filme de sangue.
Corta
Decepa
Rasga
Esfaqueia
Sangue e tripas.
Você olha pro filme com cara de nada.
Aquilo já não basta mais pra você.
Aí, alguém bate na porta
Toc toc toc
Você aperta o pause.
Abre a porta.
Beleza, Tiago.
Beleza.
O que cê ta fazendo?
Nada. Só tava de bobeira no meu quarto.
Sua mãe tá aí?
Não.
Cê tá sozinho?
Tô.
É, cara, o Tiagão ta sozinho em casa!
É!
Todos eles vão entrando.
Vamo nessa.
Tá afim de um beck?
Hum
O que CE ta vendo?
Nada.
O que é isso?
É uma suástica.
O que cê ta fazendo com uma suástica pendurada na parede?
Você é nazista por acaso?
Sorriso amarelo
É.
Eles todos olham pra você.
Por que é que cê ta nessa?
Porque sim. Eu sou ariano. Preciso proteger meu sangue branco.
Ah, ta. E como é que CE vai fazer isso?
Espera só pra ver uma coisa.
Você enfia a mão por debaixo da cama
E você saca uma espada.
Porra caralho.
Que qui é isso?
Uma Mamba Negra;
Onde cê deslocou isso?
Eu achei.
É mesmo? Porra...
Você morreu com quanto pra comprar isso?
Você nem aí.
Eu compro de você por vinte conto.
Não.
Cinquenta paus então.
Vai tomar no cu.
Cem pratas.
Olha o estrago que dá pra fazer com isso.
Você já decepou alguém?
Você sorri.
Todo orgulhoso.
Olha só pra ele
O maluco.
Daí...
Chaves na porta.
Depressa
Esconde a lâmina.
Passos nas escadas.
O que está acontecendo aqui?
Nada, mamãe.
Ela desconfia.
Você só chama de “mamãe” quando faz alguma coisa errada.
A gente só tava assistindo um filme.
Acho que está na hora dos seus amigos irem pra casa.
Até mais.
Tchau, Tiago.
Falou.
Eles somem.
E a sua mãe olha bem pra sua cara.
Tiago, senta aí, eu tenho uma coisa pra te contar.
Não, mãe.
Sinto muito, Tiago.
Mãe, não!
Tiago, fica calmo.
Não.
Sinto muito. Aconteceu.

13
Era disso que você ia se lembrar.
Você ia se lembrar da noite em que seu avô morreu.
Foi quando você morreu por dentro.
Você ia se lembrar de como você queria imobilizar alguém no chão
E arrancar os olhos do sujeito.
Ou pegar um taco de beisebol
E arrebentar a cabeça do fulano.
Só pra tirar a raiva de dentro de você.
Porque ela estava crescendo
Toda essa raiva
É você não tinha um jeito de deixar ela sair.


14
Imagina que tudo isso está passando pela sua cabeça enquanto você espera numa salinha sem o cinto nem os cadarços.
E aí o funcionário superior volta com a ficha.
Ele te entrega a ficha e você começa a ler.
Mas você não consegue se concentrar nas palavras
Então você pede pra ele ler pra você.
O que diz aí?
Me fala de uma vez! Fala!
Você não lembra mesmo?
Você balança a cabeça.
Agressão.
Incêndio.
Tentativa de homicídio.
É isso que ele te fala.
Você se lembra agora?
Uma parte.
Po que você não me conta o que aconteceu?
Vou tentar
Aí você começa a contar a história...

15
Onde você estava?
Você estava na cidade.
Com quem você estava?
Você tava com a sua galera.
A galera dos seus amigos.
Gente que eles conheciam.
Mas você não os conhecia?
Não.
Seus amigos estavam onde?
Eles foram todos embora e deixaram você com essa gente que você não conhecia.
Por quê?
Você não sabe.
Mas você começa a se lembrar.
Um deles te dá uma garrafa de vodca.
Toma, tá afim de um trago?
E você tipo assim
Tô.
Bebe pura.
Como?
É só beber ela pura.
Então, você bebeu
Você tomou só um golinho.
Tinha um gosto estranho.
Não toma
Tem alguma coisa errada.
E eles tipo assim
Vira tudo.
E você disse
Beleza.
Porque você não tava a fim de bancar o cdf babaquinha.
E você tomou um trago bem grande do troço.
E tinha Ecstasy
E tinha Valium
E você não sabia o que tinha naquilo.
E na hora que seus voltaram, você já tava doidão.
Tiago?
Você parecia “ O Médico e o Monstro”.
Beleza, veio?
Porque, num instante, você tava legal.
Onde é que cês tavam?
Senti mó falta de vocês.
Mas daí, no instante seguinte
É, onde é que cês tavam, é, onde é que cês tavam, é, onde é que cês tavam?
Tipo assim.
Me deixaram aqui, né? Cês querem que eu vá aí e acabe com a raça de vocês?
Pega leve.
E você tava olhando pras pessoas.
Mas não tava apenas olhando pra elas.
Você tava olhando pra elas como se estivesse procurando uma vítima.
Tiago, deixa disso
A gente precisa te levar pra casa.
E você lembra deles te levando pra casa.
Mas aí...

16
Tudo que você se lembra é
Gritaria
Você conseguia ouvir a gritaria.
Era que nem estar dentro de um sonho
Mas ainda estar acordado ao mesmo tempo.
E tudo que você ouve é
Tiago?
Cê ta legal?
E você sente o seu sangue fervendo.
O que houve com você?
O que você tomou?
Tiago?
E você começa a esmurrar
Tiago, não!
E a chutar
Tiago, para!
E você sente suas mãos na garganta de alguém.
O que cê ta fazendo?
Espremendo.
Não!
Para!
Por favor!
Tiago!
Não!
E então, os gritos!
E então
Ficou tudo preto


17
Imagina que você fez isso com alguém.
E você não sabe por que você fez isso.
Você só
Você queria vingança.
Você estava tão machucado
Você queria machucar outra pessoa.
Mas essa tua vingança, não foi por mal.
Você só precisava de um amigo.
Você só precisava de alguém pra conversar.
Mas em vez disso, você quase matou alguém naquela noite.
É
Você se lembra
Você se lembra de tudo.


18
Agora imagina isso
Eles te levam pra um tribunal
E eles te colocam na frente de uma juíza
E a juíza diz
Filho, eu vejo milhares de garotos como você
Todo ano
 Que são acusados exatamente dos mesmos crimes.
E a maioria deles acaba na cadeia por até dez anos.
E você fica lá em pé
Tremendo feito vara verde
Pensando
Nossa.
Dez anos.
Por favor, não.
Vai ser o meu fim.
Aí ela diz
Mas alguns deles
Eu olho para alguns deles aí onde você está
E eu sei que o lugar deles não é na cadeia.
Eu sei que eles só cometeram um erro idiota
E que o que eles realmente precisam é de alguém que lhes dê uma chance.
E ela olha pra você direto no olho.
Você é um desses garotos de sorte.
Eu vou lhe dar uma sentença de liberdade condicional.
Três anos.
E você, tipo assim
Obrigado.
Mas se você sair da linha durante esse período, vai cumprir dez anos na cadeia.
Você entendeu?
Sim.
Você pode deixar o meu tribunal.
Isso significa que você está livre.

19
Você sai
O sol brilha lá fora
Você respira bem fundo
E a sua mãe está lá
Esperando.
Ela olha pra você.
Você olha pra ela.
Como é que ela vai confiar em você de novo?
Mas ela vem andando na sua direção
Mãe, desculpa.
E ela vem correndo pra me dar as boas-vindas.
Aí nela diz
O que é que você vai fazer da sua vida?

20
Imagina.
Imagina se tudo isso acontecesse com você.
O que você ia fazer?
Sabe o que eu ia fazer?
Eu ia começar a falar.
Eu ia contar a minha história pras pessoas.
Porque quando eu fiquei com raiva
Eu quase perdi tudo.
E tudo que eu queria de verdade era alguém que sentasse do meu lado e prestasse atenção em mim.
E aí você ia pra casa.
Você ia arrancar todos os seus pôsteres nazistas.
Ia dar um fim em todas as suas facas.
Você ia olhar no espelho e tentar imaginar
O que vem depois?
E aí você ia deitar na cama.
Você ia puxar as cobertas.
E você ia desligar a luz.
Blecaute.
















quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Levando Cultura Para Quem Não Tem Acesso

Por Nanda Lellis

Somos em 11 atores, e nesse dia estávamos em 6, mas "o jogo aconteceu, mesmo nas situações mais adversas as peças sempre acontecem", nos sentimos em casa, podendo apresentar para jovens, que vivenciam tudo que passamos ou algo que ainda vamos passar. Poder trocar e aprender com o público é mágico, encantador.



Por Larissa Valença
Imensamente gratificante poder ouvir da boca do público que o texto atinge mais "a flor da pele", por estarem vivendo essas transformações aqui, agora, sem tempo, sem espaço: "Obrigada por vocês terem nos dado essa oportunidade eu pouco tinha ido ao teatro", e o melhor de tudo é que essa frase foi traduzida por um olhar doce capaz de abraçar um continente todo, se dependêssemos dele todos os males do mundo se esgotariam naquele instante. Como se não bastássemos, fomos presenteados com abraços que mostram o quanto a arte é o sonho que fortifica o ser humano, para a batalha diária, chamada vida!

Permitindo que as muralhas entre as classes sociais que foram instituídas sejam rompidas, mostra mais evidente, que elas se quer existem, afinal, a sensibilidade tão necessária e presente naquelas crianças não são provenientes de formação típica do que o dinheiro pode pagar, colégios teatros e centro de cultura caros, mas a gratidão, e o apreço pela arte fazem parte de uma formação libertária, oriundas de um local bem mais acolhedor e que precisa de investimento e crença social: a Escola Pública, inserida na periferia feita por crianças e professores aprendizes.

Quem abomina a escola pública não sabe o quão calorosa é. O corpo docente idealista e humano demasiada humano, vislumbra o potencial de cada criança, longe de visões estereotipadas. É uma via de mão dupla se entregam dedicando suas horas ao oficio mais precioso do planeta ensinar a refletir e o retorno tem valor imensurável um olhar brilhando e uma criança autônoma . Enfim, juntos estão em um processo de aprendizagem maduro mas que não perde a inocência e a crença na capacidade de reinventar que só o ser humano possui. Ao lado das árvores, dos prédios de concreto gris, e do vento que sopra desfavorável e fugaz, as almas pequeninas e grandiosas aprendem a escrever o seu próprio caminho, livre de qualquer carga opressora e que cega, eles podem criticar, criar suas próprias regras e assumir personagens os quais realmente desejam ser pela vida toda, muitos pequeninos se tornam poetas que aprendem a atribuir lirismo a realidades que aparentavam ser inóspitas mas aos poucos começam a ver além e sentir o sabor agridoce, aprendem a e carregam em si caráter irrevogavelmente mutáveis. Os mestres que regem essa orquestra democrática se tornam sacerdotes da educação e combatentes de um sistema frigido e balizado tão somente pelo dinheiro, chefe inescrupuloso da quadrinha.
Obrigada por permitir que o Apoena contribuísse como um grão de areia em meio a um mar de projetos. Obrigada, isso despertou e deixou mais latente em alguns do grupo esse anseio por levar o teatro a locais considerados carentes pela sociedade, contudo podem ser polos do livre pensar. E “flor da pele” com dosagem alta de lirismo, ritmo e danças que embalam a vida pode auxiliar nessa formação de visão atenta, mas que não deixa de ser vivida e colorida do que é a vida. Público eufórico ao ver um beijo em cena, público ativo, que interagia a cada cena a seu modo. Pois é, esse tal teatro é realmente o jogo da vida. E a vida com teatralização faz sentido quando assumimos o personagem que bem entendemos sem amarras e sem ser fantoches de uma sociedade que oprimi aquele que não se curva ou, pior ainda, aquele que não teve oportunidade e se quer foi convidado a fazer parte da quadrinha do dinheiro.